Sobre os remanescentes do Nacional Liberalismo, a Letônia nas circunstâncias da crise mundial


Victor Matjushenok, Membro editor do jornal “Socialista da Letônia”

Embora o Leste Europeu e os países Bálticos sejam mencionados como pertencentes a uma certa “nova Europa”, por serem membros do OTAN e da União Européia, a situação política e social é bem diferente em cada um. Além disso, a Letônia, devido a muitos fatores, é colocada até mesmo contra seus vizinhos, como a Estônia e a Lituânia, isolando a Polônia e/ou a República Checa. Da mesma maneira, também é diferente o conjunto de ferramentas ideológicas e de propaganda que foram usadas - e ainda são - pelos regimes burgueses para a captura do poder e para a sua manutenção.

Sem levar em consideração os fatores mencionados é difícil repassar o verdadeiro cenário apenas pela observação, de fora, da Letônia, e seus processos - desde a especificidade de um espectro político e as preferências dos eleitores nas eleições, até os fatores mostrados pelos protestos sociais e as dificuldades concretas do trabalho político de massa.

A Contrarevolução da Letônia: Nacionalista pela Forma, Capitalista pela Manutenção

O colapso da União Soviética, que aconteceu em 1991, como re¬sultado da pressão do capital inter-nacional e da traição dos líderes do país, passou por processos diferentes em território soviético, bastante específicos, dependendo do modelo administrativo e da estrutura étnica na região. Se na Rússia ou na Bielorússia prevaleceram, na consciência pública, mitos e miragens de uma orientação democrática e de mercado, na Letônia, assim que a chamada Frente Democrática da Letônia (FDL), tendo como pano de fundo a crise energética, sentiu-se forte, o cenário de uma “reforma socialista” foi rejeitado de imediato, e, com o apoio de forças imperialistas estrangeiras deu-se curso à restauração burguesa da República da Letônia como existiu entre as décadas de 1920 - 40.

O apoio à restauração burguesa dos países vizinhos foi gerado pela FDL, seguido de interesses mercenários pessoais de proprietários, que tinha características, para uma parte da sociedade, de um romance original de “nostalgia histórica” e de uma oferta ilusória de um mercado abundante - e de outra que permitiu que forças antisocialistas fizessem demagogia sobre “valores universais”, “democracia” e “livre Mercado”, praticamente até Agosto de 1991.

O paradoxo original foi a república burguesa da Letônia, em 1940. Ela não foi uma amostra nem de democracia, nem da notória liberdade de Mercado. Em 1934, o Primeiro Ministro, Karlis Ulmanis, não somente fez a revolução, mas também dissolveu o parlamento, perdoou partidos e estabeleceu uma ditadura policial militar e desenvolveu inúmeras metas econômicas público-administrativas, especialmente para o comércio e a esfera agrícola produtiva. A princípio essas práticas tiveram resultados positivos contra a crise económica daquele período, é por isso que, mesmo depois de décadas, a época da ditadura burguesa, repleta de elementos de etnocracia, se manteve na consciência da massa como um “período de prosperidade e ordem”.

E inclusive por causa dessas memórias, pintada em tons nostálgicos, que um dos principais fatores subjetivos da restauração do capitalismo na Letônia é o fator nacional. Essa especificidade também afetou a atividade do Partido Comunista da Letônia (PCL) durante esse período e pré-determinou a complexidade da situação no movimento da esquerda até o presente período.

É óbvio que se a FDL e outras forças políticas, incluindo os derrotistas do PCL, tivessem feito campanha, somente para a restauração da estrutura capitalista, eles jamais teriam recebido o apoio das massas. Embora a população da Letônia fosse muito bem educada politicamente e os benefícios sociais da liquidação do desemprego, a assistência médica gratuita, a educação, a moradia garantidos pelo Estado (de fato, recebidas por décadas, por uma geração de vida) foram tão notáveis, que a aquela população recebeu a propaganda liberal de mercado com ceticismo.

Dúvidas sobre os sentimentos nacionalistas os quais, pela natureza humana, pertencem não ao racional, mas ao emocional, resultaram não somente numa desorientação política de parte considerável da população, como permitiu que a população se dividisse pelo símbolo nacional para declarar os socialistas como “inimigos da Letônia” e dar à burguesia contra-revolucionária o título de um certo tipo de “movimento nacional-libertador”.

Mais ainda, até agora o espectro da política letônia está dividida não somente pelo critério sócio-político (os partidos de direita expressam interesses capitalistas e os de esquerda interesses dos trabalhadores empregados), mas também pela relação com a questão étnica. Os partidos da Letônia não são somente liberais, conservadores ou sociais democratas, mas nacionais-liberais, nacionais-conservadores ou nacionais- sociais democratas!

Existem, também, os partidos de centro e os de centro-esquerda, tentando resolver problemas nacionais baseados em compromissos ou, simplesmente, não os mencionando em seus programas, e o Partido Socialista da Letônia é único que defendem, essencialmente, as posições do internacionalismo marxista clássica.

No quarto Congressos, os socialistas declararam: “a política do regime atual é possível porque estamos divididos, eles tentam nos dividir através de um pertencimento nacional... Se o propósito é dividir, é fácil administrar e calar as bocas do povo. Nós somos contra essa política!”. [1]

A desindustrialização como um método de luta contra o movimento de classe

Um dos fenômenos característicos nos países onde a restauração do capitalismo se deu, o atraso do desenvolvimento foi causado pela destruição econômica, primeiramente no setor manufatureiro. Bem característico, porém, é o melhor exemplo para tais eventos, pois, durante o período soviético, a Letônia foi o país melhor desenvolvido entre todas as repúblicas soviéticas. Deixando de lado a recessão, que era inevitável, causada pela ruptura das relações econômicas com outras repúblicas da União Soviética e os países do campo socialista e como transição para os métodos de gestão capitalistas, obviamente, vem com as privatizações, inicialmente, a acumulação inicial da nova burguesia e as grandes preocupações da União Européia e mundiais para controlar inteiramente ou simplesmente liquidar a economia e os meios econômicos da Europa Central, do Leste Europeu e da antiga URSS, como possíveis competidores.

Enquanto isso, outros interesses existiram, incluindo alguns bastante específicos que podem ser citados como exemplos da Letônia. As ações da elite do governo, referentes à destruição da economia manufatureira, foram definidas pelo conjunto de fatores que seguem:

1. Grande parte do capital estrangeiro foi utilizada para equalizar o mercado de commodities e a destruição de potenciais competidores;

2. Privatização de ativos materiais pela nova burguesia e parte dos antigos soviéticos, assim como pela elite do partido com interesses mercenários. Esse é um tipo variante de roubo para o acúmulo inicial de capital;

3. Liquidação dos grandes coletivos de trabalho como possíveis bases para a consolidação da classe trabalhadora e para protestos sócio-políticos;

4. Realização do conceito nacionalista de “Estado Étnico”;

5. Ausência de profissionais especializados na administração de grandes estruturas industriais em meio a uma nova camada dominante.

Os dois primeiros fatores são comuns em muitos países do ex- campo socialista. Quanto aos outros, muitas explicações precisavam ser feitas. A questão é que, além da energia, dos transportes e dos meios de comunicação para manter um nível normal de vida aos moldes do século XXI, hoje, na Letônia, não existe mais nenhuma indústria que tenha mantido a importância, a gama de produção e o número de trabalhadores empregados do período anterior, a maioria deles da esfera da metalurgia, mecânica, engenharia elétrica e microeletrônica, setores nos quais mais de 10 milhões de pessoas trabalharam, e que na década de 1990 perderam seus empregos. Essa situação é completamente original. Os líderes dos países, com toda negação ao socialismo, deveriam entender que tal derrota industrial coloca em dúvida não somente as potencialidades econômicas do país, mas também sua adequada existência. Contudo, a avidez e o medo do possíveis protestos sociais se mostraram mais fortes do que as argumentações e, em 2004, a Letônia entrou para a União Européia com “indústrias” que foram caracterizadas como de equipamentos e um número de trabalhadores que estavam habituados com fábricas do início do século XIX: 76% de todas as empresas em funcionamento eram micro-empresas com 9 trabalhadores; 20% eram pequenas, com 10 a 49 pessoas. [2]

A nova burguesia cobriu o medo da classe com a retórica do nacionalismo, uma arma utilizada para a obtenção do poder que mostrou sua eficiência. Ela tem explicitado que a grande industria é uma esfera “alheia ao povo letão”, “imposta de fora”, que não está em conformidade com o estado étnico.

No programa da FDL de 1989, abordando os problemas econômicos, é informado que “a FDL considera que,... no caso de necessidade, um plano de remodelação deverá ser implantado ou mesmo o fechamento de empresas”. [3] Como um resultado dessa plataforma todas as industrias se inquietaram...

Aqui é necessário explicar que a estrutura nacional, para os moradores das cidades e, em particular, para os ocupados na indústria, se diferencia de outras esferas - devido a razões históricas, a maioria dos técnicos e do pessoal das indústrias é formada por não-letões. Assim, essa parte (mas não todos, como ideólogos da direita nacionalista insistem), chegaram na Letônia de outras regiões da URSS entre as décadas de 1950-80. Por exemplo, entre 1976-80, a participação no ganho da mecânica, em geral, na população urbana foi de 71%, e entre 1981-82, de 67%. [4]

Esse fato, depois de 1991, funcionou, pela chamada “razão legislativa”, contra os estrangeiros e seus descendentes privando-os de seus direitos civis, igualando suas atividades e posições no mesmo patamar dos estrangeiros ilegais, embora essas pessoas que chegaram na Letônia não tenham desrespeitado as leis do Estado operando naquele momento, quando mudaram de um território administrativo para outro, da URSS. Usando similar demagogia e especulando os sentimentos nacionais, os políticos, para preservarem o poder, impuseram aos eleitores uma idéia louca de desenvolvimento nacional perigoso no caso de existir, no território, pessoas de língua estrangeira e de outra etnia e a necessidade de destruição das indústrias já existentes para implantarem as nacionais que impulsionassem a Letônia, embora a maioria dos estrangeiros que trabalhavam nas industrias da Letônia não tenham ido embora do país (eles associam suas vidas à Letônia, o que, para muitos, é a única terra nativa, uma vez que suas terceiras gerações nasceram no país). Neste país estão morando mais de 300 mil estrangeiros, a base das propostas sócio-políticas dos nacionalistas de direita, que, infelizmente, ascenderam ao poder.

Sob a bandeira do nacionalismo ocorreu não apenas a estratificação social, mas também uma perda em massa da solidariedade e consciência de classe, destruiu os gigantes industriais, trabalhadores se tornaram pequenos comerciantes ou artesãos por causa da destruição da industria, no setor agrário representantes administrativos se tornaram donos de sesmarias e fazendas, trabalhadores rurais se diluíram na economia primitiva natural do país e parte dos trabalhadores, por causa do caos econômico, simplesmente se degradaram, assim como membros valiosos da sociedade. Golpe característico: mesmo com as dificuldades sociais e econômicas e chocantes indicadores de desemprego e míseras garantias sociais, na Letônia, depois de 1991, não houve NENHUMA greve no setor industrial.

O Pulo do Fracassado “Tigre Báltico”

Assim, é necessário observar que no inicio dos anos 90 novas estruturas e atributos da criação da soberania tiveram sucesso rapidamente. Estes sucessos foram apreciados, formais, externos e fruto de demonstrações propagandísticas, mas criaram ilusões de desempenho pelas forças de direita nacionalista em relação às obrigações assumidas. Portanto, apesar da desordem econômica e dos problemas financeiros de parte considerável da população, a situação social estava bastante estável. Isso pode ser explicado por alguns fatores específicos:

Primeiro de tudo - o crescimento nacional que resultou na restauração da independência do Estado. Mais precisamente, nesse plano podemos falar, somente, sobre a soberania formal, na ditadura franca e na manipulação do capital internacional sobre autoridades locais, mas no nível da consciência domestica isso não diferiu... Se para os cidadãos russos, por exemplo, a década de 1990 significou não somente dificuldades econômicas, privações materiais, mas também a humilhação moral ligada à desordem da velha soberania e a inabilidade da nova para lidar com as ações externas e internas, para os letões, era tempo de certas criações: novas estruturas de poder e administração, sistema monetário, segurança, forças armadas. Deste modo, independente do fator moral, houve, também, um fator material: no período de colapso da industria e das grandes empresas agrícolas, a esfera orçamentária (e, primeiro de tudo, o setor público) deu não somente um salário estável, mas também o máximo de possibilidades para aquele período, garantias sociais, perspectiva de realizações pessoais, carreira de Estado. E necessário adicionar ajuda política e, em parte, econômica para a restauração do sistema capitalista do imperialismo internacional e o uso bem sucedido da posição geográfica e da poderosa infra-estrutura criada pela União Soviética no que tange aos transportes, aos oleodutos e aos portos marítimos.

Durante a pilhagem econômica, a Letônia passou a ser fonte de commodities cotadas em bilhões de dólares e os fluxos financeiros deixando mínimas, mas, no entanto, significativas para um país pequeno, receitas fiscais e outras. Assim, a exportação de capitais muitas vezes teve origem duvidosa, mesmo do ponto de vista do novo, das leis do mercado, que também influenciaram no comportamento dos políticos locais e na característica dos partidos políticos que servem aos interesses da burguesia. Exceto nos momentos reais de corrupção, houve ocorrência de centros originais, regiões de nascente bem-estar em Riga, Ventspils, Jurmala - locais de transição de desenvolvimento de negócios, capital financeiro ou concentração dos “novos ricos”. Assim, para os grupos de trabalhadores contratados para esses setores, ou que foram ocupados para os serviços dos donos do capital, o cenário é mais de pequenos burgueses do que de proletários, e que se reconheçam como tais. Tudo isso foi compreendido por pessoas ativas no marxismo. Em 1995, no primeiro congresso do PSL, resoluções especiais foram adotadas: “o curso realizado pelo Estado, em nome da legislatura maior, o governo e o Banco Central, leva à degradação do país. As forças políticas atuais no poder transformaram a economia em seus próprios meios de sobrevivência e, convulsivamente, numa maneira de resolverem seus problemas de propriedade”. [5]

Mas a crítica do dispositivo sócio-político e as ações das autoridades socialistas, diante de todos os fatos listados, foi percebida pela maioria da população pobre, devido ao fato de haver injustiça social em todo o país, discriminação política e étnica, que foram esclarecidas num todo, e parte considerável da massa estava em posição bastante controversa: mesmo os indicadores oficiais (inestimáveis) de desemprego alcançaram, na região 27% da população ativa, 20 milhões de crianças não vão às escolas e 710 milhões habitantes (de uma população de 2,3 milhões), no geral, foram privados dos seus direitos civis básicos e, assim, são impedidos de agirem no âmbito político do Estado, mesmo nas auto-gestões. No entanto, o Partido Socialista da Letônia nunca atuou em cenário político tão difícil, e durante este período, mesmo sem aliados políticos, foi possível eleger deputados para o parlamento Letão, o que mostra que o Partido conta com apoio de um número considerável de simpatizantes.

Para a economia é claro que os setores de transporte e construção, e especialmente, de serviços, são auxiliares no setor produtivo. Portanto, as consequências do colapso da grande indústria e da agricultura já haviam começado a afetar o Estado no final da década de 1990. Devido a algumas razões, houve problemas com empresas de transportes - que permaneceram por causa do serviço interestadual e das exportações para a Rússia, que sofreram grandes pressões de competidores europeus - e com indústrias de alimentos e energia. Para a economia, a cotação da moeda nacional, superestimada pelo Banco da Letônia, teve consequências extremamente negativas. Nessas condições, as forças políticas que mandam no país foram cobrados pela OTAN e pela UE. A possibilidade de fazer parte da UE foi uma maneira de salvar os direitos do povo letão frente à bancarrota econômica, social e política.

Quando a possibilidade de adesão à UE se tornou real, e isso foi necessário para convencer a população (ao contrário das autoridades, o povo letão assistiu à entrada na UE com vigilância), o Ministro das Finanças daquele período expressou-se veementemente, reconhecendo abertamente, que, de outra maneira, o povo poderia esperar uma deficiência catastrófica nos seus rendimengtos. Portanto, essa decisão foi tomada sem haver nenhum tipo de discussão pública. A posição do PSL, obviamente prevendo as vantagens na integração ao euro, todavia, foi reduzida a uma definição da UE como uma união do grande capital da Europa para manutenção, primeiramente, dos interesses de classe opressora. Lenin, quase cem anos atrás, havia escrito sobre união semelhante em toda a Europa: “certamente, acordos temporários entre capitalistas e detentores do poder serão possíveis. Nesse caso também será possível uma União Européia, como o acordo dos capitalistas europeus... Para que? Somente para pressionar o socialismo na Europa”. [6]

Portanto, para os socialistas letões estão claras as razões políticas que foram prontamente aceitas pelos países da UE - sua preliminar aceitação na OTAN mostra, com franqueza, as razões - pois os mesmos não têm capacidade de adotar critérios econômicos.

Ao mesmo tempo, o partido socialista tentou usar contatos no Parlamento Europeu para estabelecer contatos mais próximos com os partidos comunistas e de trabalhadores dos países da Europa, e ajustar, com eles, cooperações para os interesses dos trabalhadores letões. [7] Mesmo em 2000, quando esses temas começaram a ser discutidos na sociedade, o PSL tinha definido, claramente, sua atitude: Nós não vemos vantagens econômicas e políticas do alistamento da Letônia à União Européia. Tendo entrado para a UE, a Letônia irá perder parte da sua independência nos campos da economia, política, cultura, da economia nacional como um todo”. [8] Do momento do ingresso à UE se passaram cinco anos. Em termos miúdos, essas são consequências do despreparo da Letônia para esse bloco, ações irresponsáveis e aventureiras dos partidos políticos de direita que estavam ocupados nesse processo, com a economia, em primeiro lugar, integração, acertando ao se mostrarem socialistas. A Letônia fazendo parte da UE não deu, praticamente, nada ao seu povo, seja na segurança social ou nas garantias políticas civis: o serviço social, assim como antes, está pobre e imperfeito, proibições políticas são tomadas indistintamente. O status selvagem e humilhante dos estrangeiros é mantido, a repressão aos seus direitos políticos continua. Contudo, investimentos econômicos na estrutura do euro e a atividade do capital internacional (primeiramente, na especulação financeira) deram fôlego à atividade econômica. Indicadores de crescimento do produto bruto nacional alcançaram 11% em 2007, o que permitiu aos propagandistas de direita falarem da Letônia como “O Tigre Econômico Báltico”, e à união dos partidos liberais de direita ganhar as eleições parlamentares em 2006.

Assim, o setor real da economia sofreu perdas essenciais: a indústria açucareira está destruída, a agricultura, como um todo, passa por sérias dificuldades, assim como a pesca. As piores conseqüências são sentidas pela atividade incontrolada, no país, dos bancos estrangeiros, provocando um tácito consentimento do governo de crédito incontrolado para apostar na esfera imobiliária. Apesar de Karl Marx, no século XIX, em “O Capital” ter escrito sobre o caráter duplo, peculiar e hábil do sistema de crédito "... de um lado, para desenvolver a força motriz da produção capitalista, é necessário o enriquecimento de alguns através do trabalho de muitos, no sistema do mais limpo, da paixão mais colossal, pela barganha, reduzindo mais e mais o número daqueles poucos que mantêm as riquezas públicas; por outro lado, fazer a transição para um novo modelo de produção”. [9] Notadamente, consequências negativas começaram a aparecer antes da crise geral do sistema capitalista. Isso não é surpresa se olharmos, por exemplo, para o crescimento da dívida externa da Letônia:

 

Anos, Trimestre, Contas LVL

2004 III

2005 III

2006 III

2007 III

2008 III

Dívida externa (netto)

2,002.4

2,787.5

4,275.8

6,940.2

8,684.0

 

Em 2008 o governo letão conseguiu financiamentos com o FMI, o Banco Mundial e a Comissão Européia de, aproximadamente, 7,5 bilhões de euros até o final de 2009 (5,122 bilhões Lats) e a soma do débito público total é maior que o dobro e excederá o orçamento anual. Para um país como a Letônia, com sua indústria manufatureira destruída e com a ausência de qualquer tipo de recurso natural para exportação isso significa que a dependência da divida é praticamente impossível é a perda total da independência é possível. E para o povo: prosperidade material e segurança social decepcionaram.

Passividade social: sair do país é mais fácil do que lutar

Nas condições das crises social e econômica, que existem na Letônia desde o início de 1990, seria natural esperar protestos de massa e ações dos trabalhadores, em cujos ombros caem as conseqüências da reestruturação capitalista, os erros e os abusos dos partidos burgueses de direita no poder. De qualquer maneira, desde os eventos de 13 de janeiro de 2009 (quando em Riga houve confrontos com a polícia local em uma tentativa de entrada em um prédio do parlamento), no país não houve nada que pudesse chamar a atenção, como protestos sociais. O PSL, através das organizações de base, a ajuda do jornal “República Socialista da Letônia” e uma campanha na Internet de partidos e outras organizações de esquerda, todos em campanhas eleitorais, durante as ações, remeteram às datas históricas significativas, como o Primeiro de Maio ou o feriado da Vitória sobre o Exercito Hitlerista na Segunda Guerra Mundial, insistentemente explicando aos trabalhadores a essência do processo em curso no país, suas razões e conseqüência, oferecendo caminhos de decisão.

Contudo, é necessário admitir que, embora a idéia socialista seja popular no meio dos trabalhadores (o que se expressa na quantidade de votos no PSL em várias eleições), ainda não se atingiu a consolidação, pelo menos no nível social e econômico, das demandas econômicas e do aumento da consciência de classe. As razões da passividade social no início dos anos de 1990, no período de restauração do capitalismo, estão mencionados acima, como a posição inerte dos trabalhadores na última década. Uma das causas principais é que depois da entrada da Letônia na UE, para as forças políticas no poder foi possível “exportar” parte dos problemas internos. O mais sensível deles na forma de desemprego, baixos salários, resolvido pela abertura de mercados de trabalhos em alguns países como a Irlanda e o Reino Unido. Em um relatório ao XI Congresso, o PSL observou: “O povo vai para fora para trabalhar não porque a Letônia não é grata por ele, mas porque ele não pode viver e trabalhar aqui e ajudar a sua família. Eles estão prontos para sofrer preconceitos, se separarem de suas famílias e parentes, viver para sustentarem os mais velhos, para os quais as aposentadorias não cobrem sequer as necessidades essenciais, garantindo estudos para as crianças”. [10]

Nas condições onde, em apenas duas horas (tempo de vôo da Letônia até o Reino Unido), os letões desempregados vão para este país onde o salário mínimo excede cinco ou mais vezes o que eles poderiam receber em sua terra natal, é muito difícil convencê-lo de não aproveitar essa chance e lutar pela classe. A esses processos foram adicionadas as chamadas “febres do crédito”, mencionadas acima. Os métodos usados pelos bancos internacionais são familiares para os países europeus e suas experiências de vida sob a ajuda capitalista para reagir às promessas generosas mais adequadas dos banqueiros. Letões (assim como outros habitantes de outros modelos de países socialistas) apareceram psicologicamente defensivos diante da tentação do crédito.

Na reestruturação econômica dos primeiros anos depois da entrada na UE, um número considerável de pessoas ocupadas não somente no serviço civil, mas em pequenos e médios negócios, assim como trabalhadores das indústrias monopolistas, de transporte ou da construção civil puderam comprar apartamentos, móveis caros ou carro novo. Certamente compraram no crédito, através da especulação habitacional, e com complicados e severos termos de pagamento. Mas parece que, para esse povo, os delírios da “sociedade do consumo” e “possibilidades iguais” do moderno capitalismo se tornaram realidade. Tentativas de mostrar a eles a falsidade de similar decepção, o perigo de apostarem nas redes bancárias ou, especialmente, demonstrações de insuficiência econômica no país, não foram percebidas.

Uma substancial consciência pública compõe essa condição de que a vida real, para a geração atual que não conheceu o socialismo real, é abençoada e as garantias, crescendo na selvageria do estágio inicial da restauração capitalista, gerada, particularmente, pela influência da falsa propaganda burguesa. Por exemplo, uma pesquisa feita entre alunos colegiais (jovens entre 17 e 19 anos) mostrou que nas suas relações sócio-políticas e étnicas, parte dos participantes têm um conceito positivo sobre o que é “socialismo”, “solidariedade”, “altruísmo”, mas compreendem de forma negativa o “comunismo” e o “coletivismo”...

Isso mostra os sérios problemas em entenderem a base da vida social pela nova geração, as contradições nas suas opiniões e crenças. Por um lado, baseados nas histórias de famílias dos membros mais velhos, fontes objetivas de informação, muitos ligados ao conceito de socialismo, não causam nenhum tipo de emoção negativa. Por outro, seguindo a ideologia oficial do Estado mostrada em livros escolares, escolas e programas públicos disciplinares, campanhas políticas na UE igualando comunismo ao nazismo, nas quais se encontram a vanguarda dos políticos de direita da Letônia, houve uma vaga imaginação sobre o conceito comunista. Séria influência na forma de viver das pessoas também rendeu a mencionada destruição das grandes empresas industriais e, conseqüentemente, dissociação. Até mesmo as ações das reuniões sindicais e as greves com limitadas exigências econômicas, que faziam parte da Letônia, mostram essa dissociação. Praticamente todos eles passaram a agir separadamente: professores, físicos, camponeses polícia, trabalhadores de pequenas empresas de auto-gestão agiram pelas exigências específicas de suas categorias e jamais anunciaram nenhuma ação de interesse geral. Por isso é necessário prestar atenção em todos os grupos mencionados e que estão insatisfeitos, mencionando os não-produtivos, que têm pagamentos orçamentários. Ressaltem-se os fazendereiros-camponeses responsáveis por ações como a ocupação das rodovias ou “a marcha dos tratores” para Riga, que aconteceu no inverno passado. Mas até mesmo suas reivindicações, por um lado, têm a característica do pequeno empresário, e por outro lado eles expressam somente o desejo de receberem parte do orçamento e, nesse plano, há uma pequena diferença dos protestos dos trabalhadores. Assim, é necessário mencionar que esses fazendeiros, em sua maioria, não representam nenhum camponês. Sendo donos de grandes áreas e, freqüentemente, donos de empresas de transformação, utilizam trabalho assalariado e, objetivamente, representam a camada média da burguesia rural. A ausência de solidariedade não causa, praticamente, nenhum protesto ou contra- ação às políticas do governo de direita. Por exemplo, durante o referendo, em 2008, sobre a mudança do sistema de pensão, os partidos no poder agiram para convencer os jovens trabalhadores de não participarem, uma vez que, no sistema, o crescimento ostensivo nos pagamentos dos atuais pensionistas poderia acabar com suas poupanças futuras. O referendo falhou por causa do baixo número de eleitores presentes.

O elo fraco da restauração capitalista

A situação econômica e social mundial atual, agravada por fatores internos específicos, já levou à perda de confiança das pessoas na camada dominante da Letônia, e a um confronto com a polícia em 13 de janeiro. No futuro próximo isso pode afetar, radicalmente, acordos políticos no país. Pela primeira vez, em duas décadas, o bloco de centro- esquerda, “Centro de Consentimento”, do qual o PSL faz parte, ganhou, por larga margem, o primeiro lugar na preferência dos eleitores. Nas eleições do Parlamento Europeu o bloco recebeu dois mandatos, um dos quais pertence ao presidente do PSL, Alfred Rubiks. Durante as eleições municipais, o “Centro de Consentimento” recebeu a maioria dos votos, em uma série de auto-gestões, incluindo (embora tenha havido uma coligação com partidos de centro-direita) a capital. Há uma possibilidade real de recepção da maioria pelas forças deste bloco como um resultado das eleições parlamentares. Assim, a Letônia pode se tornar um “elo fraco” original entre os países do campo socialista com constante intervenção de direita nos últimos anos.

Tal variação é possível por causa das razões que seguem. Tendo encarado problemas sociais e econômicos sérios, a população da Letônia, necessariamente, pergunta: por que isso aconteceu, quem é culpado e quem, inclusive, pode resolver a situação? A resposta sobre o culpado é óbvia, até mesmo entre as camadas que são, absolutamente, apolíticas ou leais às pessoas e grupos no poder. E também porque os partidos de direita, dentro dos limites da ideologia liberal de mercado, não podem oferecer nenhuma alternativa de êxito depois da crise. Isso começa a influenciar, inclusive, o segundo componente ideológico do atual modelo letão - o nacionalismo. Devido ao tempo de tentativa de imposição de suas idéias (que foram mantidas por uma série de medidas de protecionismo nacional, por exemplo, na esfera da educação ou seleção de pessoal), o povo começou a refletir: se aqueles que estão no poder mentiram sobre a “auto-regulamentação da economia de mercado” ou sobre a “justiça social no capitalismo”, é possível que eles mintam, também, sobre o tratamento com as pessoas de outra nacionalidade, cultura ou língua.

Essa compreensão, se atingir um considerável número de representantes da camada de trabalhadores, é capaz de superar um dos principais obstáculos da solidariedade de classe na luta pela mudança no sistema social da Letônia - a dissociação nacional. Percebendo isso, os políticos de direita da Letônia recentemente deslocaram a ênfase de suas ações de oposição inter-étnicas no país em busca de inimigos externos. E selecionaram o vizinho: a Federação Russa, para a qual o discurso é de reprovações políticas e históricas e, até mesmo, demandas materiais. No coração dessa política recai o conceito da chamada “ocupação soviética” e, na Letônia, trabalha, inclusive a Comissão Estatal especial para a estimativa dos danos que, ostensivamente, foram causados pela União Soviética de 1940 até 1991! Na mesma direção opera o Ministério das Relações Exteriores da Letônia e os deputados de direita da Letônia no Parlamento Europeu, lutando para que a ideologia comunista seja reconhecida como criminosa e igualando-a ao nazismo.

O que é característico é que essas ações não só não são condenadas pela social-democracia influente da Europa e pelos Democratas Cristãos como - o que é ainda pior - pelos partidos “socialistas”, mas recebem suporte estreito e claro deles. Ademais, para uma estimativa do campo político da Letônia é necessário ter em mente que, como resultado da crise e a soma dos débitos, seu governo perdeu, de forma apreciável, sua independência e o campo de manobra nas decisões que dizem respeito aos problemas sociais e econômicos.

Qualquer governo, incluindo um de esquerda, independentemente do nível de apoio no país, irá enfrentar forte pressão de imediato, não só de nacionais-liberais locais, mas também da maioria de direita da UE, de estruturas como o FMI e do capital internacional.

Qualquer resultado de realização de transformações sociais na Letônia serão possíveis, somente, em condições de apoio do movimento de esquerda e comunista internacional de crescimento de sua força e autoridade solidariedade na luta contra os monopólios e os imperialistas, a unidade’ da classe trabalhadores com outras camadas nacionais. F finalmente, somente com as mudanças revolucionárias radicais o caminho para o socialismo em nível nacional e europeu é possível.


[1] "Partido Socialista da Letônia. História em Documentos", 2006 p. 134;

[2] ibidem. 534;

[3] Programa da Frente Nacional da Letônia, Riga, avots 1989, p.16;

[4] “Tendências e Perspectivas da Letônia na URSS: população em desenvolvimento”, “Zinatne” 1986, table. 2-4;

[5] “¡Partido Socialista da Letônia. História em Documentos”, p. 68;

[6] Lenin V.I. rascunhos “Sobre o slogan dos Estados Unidos da Europa”, publicação política governamental, Moscou, 1952, t. 21 p. 310;

[7] “Partido Socialista da Letônia. História em Documentos" p.191;

[8] Marx “O Capital”, resumos de K. Marx e E Engels, publicação política governamental, Moscou, 1961, t. 25 p. 485;

[9] “Partido Socialista da Letônia”; “Material do IX Encontro”, Riga 2008 p. 4;