"O proletariado luta para derrubar a burguesia imperialista através da revolução; a pequena burguesia defende o “aperfeiçoamento” reformista do imperialismo, a adaptação a ele, submetendo-se a ele" [1]
V.I. Lenin
"O proletariado luta para derrubar a burguesia imperialista através da revolução; a pequena burguesia defende o “aperfeiçoamento” reformista do imperialismo, a adaptação a ele, submetendo-se a ele" [1]
V.I. Lenin
O capital é uma força internacional, o que requer que a classe trabalhadora se transforme também em força internacional organizada. O longo caminho percorrido pelo movimento comunista e dos trabalhadores, desde a criação da Associação Internacional dos Trabalhadores até os dias de hoje, foi atravessado por um debate constante entre duas posições: a revolucionária, que expressa os interesses do proletariado; e a oportunista, expressão da influência da política e da ideologia burguesa no movimento operário.
No nível europeu, a constituição do Partido da Esquerda Europeia (PEE) como instrumento para a construção de um polo oportunista de dimensão continental e força para a colaboração de classes no marco da União Europeia, torna necessário que os partidos comunistas que fundamentam sua política no marxismo-leninismo exponham com clareza seus pontos de vista sobre esta nova coalizão de forças oportunistas, que são, como veremos, “recomendadas” pelo capital.
A luta anti-imperialista na qual estamos engajados se dirige contra o imperialismo como sistema, contra o capitalismo em sua fase superior, o que implica em uma confrontação direta contra as uniões imperialistas e contra as organizações políticas que as apoiam em um grau ou outro. Como em outras situações ao longo da história, o triunfo das posições revolucionárias no movimento popular e dos trabalhadores exige uma luta decidida contra o oportunismo em todas as suas formas e manifestações.
Considerando as importantes lutas que estão por vir, não pode haver nem tolerância nem coexistência com o oportunismo. Uma das tarefas urgentes que o movimento comunista deve enfrentar é a de se fortalecer na frente de batalha das ideias, o que abre a possibilidade de disputar a hegemonia em todos os terrenos em que as forças da conciliação de classes, como o oportunismo e a socialdemocracia, mantêm no movimento operário e sindical. A luta contra o PEE e suas forças em cada país não é uma opção para as forças marxistas-leninistas – é uma necessidade, derivada das condições mesmas em que se desenrola a luta de classes.
De onde vem o projeto do PEE? Que forças o impulsionam? A que interesses servem estas forças? Vejamos.
No artigo “Do eurocomunismo ao oportunismo dos nossos dias”, publicado no nº 2 da Revista Comunista Internacional, o eurocomunismo era definido como uma corrente revisionista de direita oposta ao socialismo científico e inimiga do marxismo-leninismo, que serviu de veículo à penetração da ideologia burguesa nas alas da classe trabalhadora e do movimento comunista[2].
Esta corrente foi sumamente eficaz em sua tarefa de dividir e debilitar o movimento comunista internacional, atuando em seu seio como “quinta coluna”, em oposição aberta às forças que se mantinham leais ao marxismo-leninismo e aos países socialistas. Suas posições, nas condições capitalistas de gestão da crise de superprodução e superacumulação de capital iniciada nos anos 70, foram um muro de contenção da luta operária, canalizando a ira popular nos limites do sistema daquilo que se convencionou chamar “Estado de Bem-Estar”.
O eurocomunismo não desapareceu com o triunfo contrarrevolucionário na URSS e nos demais países socialistas do leste europeu. Desde o início, esteve orientado a fragmentar o movimento comunista, fomentando o surgimento de um polo oportunista europeu com vocação hegemônica. Como veremos, nesta tarefa o Partido Comunista da Espanha (PCE) teve e tem um importante papel.
O VIII Congresso do PCE, celebrado no ano de 1972, teve acordo em apoiar a entrada da Espanha na então Comunidade Europeia por considerar que esta era <<uma opção estratégica de fundo que respondia à necessidade de atuar no marco supranacional no momento em que se estava produzindo uma clara internacionalização da economia, a interpenetração dos mercados, o desenvolvimento dos comércios e dos meios de comunicação, e ao mesmo tempo a necessidade de ir avançando em direção a espaços geográficos e políticos homogêneos>>[3].
Quatro anos depois, em junho de 1976, celebrou-se em Berlim a Conferência de Partidos Comunistas e Operários da Europa, na qual os Partidos Comunistas da Espanha, da França e da Itália apresentaram, através de uma frente comum, a plataforma eurocomunista, na qual tinha um peso decisivo o apoio ao processo de gestação de uma união interimperialista europeia.
Estas posições seriam ratificadas pelo IX Congresso do PCE – o primeiro na legalidade depois de 46 anos –, que se reuniu em Madrid de 19 a 23 de abril de 1978, e no qual se acordou formalmente o abandono do marxismo-leninismo e se elaborou a definição ideológica que o PCE conserva até hoje. As teses deste congresso recolheram as propostas revisionistas que a direção eurocomunista havia imposto progressivamente desde meados dos anos 50, tal como reconheceria Santiago Carrillo[4] em seu Informe ao Congresso em nome do Comitê Central eleito:
<< Esta vontade firme é que nos levou, não a abandonar o leninismo – como andaram dizendo –, mas a propor na definição que trazemos ao Congresso e que se discutirá no momento oportuno, um texto que pensamos que corresponde melhor ao que vem sendo a prática política do partido e suas elaborações teóricas da experiência revolucionária vivida desde há mais de 20 anos.
A respeito disso quero dizer que o debate de fundo sobre estes problemas não é novo; iniciou-se, pelo menos, há vinte e dois anos, tanto sobre a reconciliação, a aliança das forças do trabalho e da cultura, o pacto para a liberdade, o socialismo em liberdade, a integração dos cristãos no partido e outros temas, como sobre nossas concepções sobre o movimento internacional comunista e dos trabalhadores e nossas divergências com grandes partidos comunistas que estão no poder>>[5].
O IX Congresso do PCE se posicionou de novo a favor da participação da Espanha na Comunidade Econômica Europeia (CEE), com um discurso que sem dúvida trará à memória do leitor o que vem sendo defendido hoje por algumas forças políticas no âmbito europeu:
<< O PCE, ao defender o ingresso da Espanha na CEE, afirma sua vontade de transformar, ao lado das demais forças de esquerda da Europa, o caráter atual da Comunidade, dominada por grandes monopólios. Aspiramos à Europa dos trabalhadores, à Europa dos povos: uma Europa unida nos planos econômico e político, que tenha uma política própria, independente; que não esteja subordinada nem aos Estados Unidos nem à União Soviética, mas que mantenha relações positivas com ambas as potências; uma Europa que seja um fator autônomo da política mundial, contribuindo assim para superar os blocos militares e a bipolaridade, para democratizar a vida internacional, facilitando a todos os povos maior liberdade para serem donos de seus destinos. A distensão e a coexistência terão assim um conteúdo mais efetivo e mais profundo>>[6].
Ao mesmo tempo, se marcava uma política de alianças muito concreta:
<< (...) consideramos essencial iniciar, com espírito aberto, audácia e seriedade, um diálogo entre partidos comunistas, socialistas e socialdemocratas da Europa Ocidental para buscar pontos de coincidência que propiciem a ação comum por objetivos concretos, que apontem para uma saída progressiva da crise do sistema capitalista>>[7].
Nas teses deste congresso se definem as linhas essenciais do que será até hoje a posição do PCE, em boa medida plasmada também nas teses do PEE. Correndo o risco de cansar os leitores, consideramos oportuno citar algumas passagens de teses congressuais posteriores do PCE, que evidenciam o importante papel desempenhado em nível europeu pelo revisionismo espanhol.
No XII Congresso do PCE, celebrado em Madrid em fevereiro de 1988, no qual foi eleito Julio Anguita como Secretário Geral, se afirma:
<<É, portanto, necessária uma transformação profunda da Comunidade Europeia. Para realizá-la, apostamos na construção de amplas alianças, a partir do movimento operário e de outras forças sociais progressistas, sustentadas no terreno político pela convergência dos partidos comunistas, socialistas, socialdemocratas, de trabalhadores e verdes>>[8].
No Documento-Base da V Conferência Nacional do PCE, reunida em Madrid em 1989, se condensam as posições favoráveis à União Europeia adotadas já em linhas gerais em 1972. Em síntese, a posição oportunista sobre a UE se caracteriza pela defesa da entrada e permanência da Espanha na União Europeia, pela defesa de uma UE unida política e economicamente, com uma política internacional independente, sob a bandeira da Europa social ou Europa dos povos; pela organização de uma força de esquerdas de dimensão europeia nascida da confluência de comunistas, socialdemocratas, trabalhistas e verdes; e pelo apoio à consolidação da Confederação Europeia de Sindicatos, impulsionando a incorporação à CES das COs [N. do T.: Comissões Operárias espanholas, criadas no combate ao franquismo e na luta por direitos e reunidas em Confederação Sindical nacional a partir de meados dos anos 70. O PCE tem peso importante aí, mas elas são politicamente mais amplas, contando com a participação de diferentes setores políticos.], da CGT francesa e da Intersindical Portuguesa[9].
Como demonstram as passagens reproduzidas, o denominado Partido Comunista da Espanha vem jogando papel relevante na elaboração das posições políticas posteriormente adotadas pelo Partido da Esquerda Europeia, cuja criação foi prevista pelos oportunistas espanhóis faz mais de três décadas. Igualmente, se demonstra a continuidade entre as posições fundadores do eurocomunismo sobre a União Europeia e a atual posição dos Partidos Comunistas transformados que fazem parte do PEE, entre eles e de maneira destacada o PCE.
Com o envolvimento ativo das instituições europeias, se fundou em 2004 a ampla aliança oportunista de dimensão europeia buscada pelo PCE desde o triunfo do eurocomunismo. As forças oportunistas do PEE acordaram, no denominado Convite de Berlim à constituição do Partido da Esquerda Europeia assinado no 11 de janeiro de 2004, defender uma <<Europa democrática, social, feminista, ecológica, pacífica, uma Europa da solidariedade>>[10].
Belas palavras, sem dúvida. Entretanto, como se costuma dizer, de boas intenções o inferno está cheio. E assim advertia Lenin em seu conhecido artigo sobre A bandeira dos Estados Unidos da Europa, no qual além de expor a lei da desigualdade do desenvolvimento econômico e político no capitalismo, fundamentando a possibilidade de triunfo da revolução socialista em alguns países e mesmo em um só país, desenvolveu a análise marxista sobre o caráter de uma possível aliança de países europeus nas condições do imperialismo. Reproduzamos algumas passagens:
<< Do ponto de vista das condições econômicas do imperialismo, ou seja, da exportação de capitais e da divisão do mundo entre as potências coloniais “avançadas” e “civilizadas”, os Estados Unidos da Europa sob o capitalismo são impossíveis ou são reacionários...
A guerra não está em contradição com os fundamentos da propriedade privada, sendo mesmo o desenvolvimento direto e inevitável destes fundamentos. No capitalismo é impossível um processo uniforme de desenvolvimento econômico das distintas economias e dos distintos Estados. No capitalismo, para restabelecer de tempos em tempos o equilíbrio alterado, não há outro meio possível a não ser as crises na indústria e as guerras na política.
Desde já, são possíveis acordos temporários entre os capitalistas e entre as potências. Nesse sentido, são também possíveis os Estados Unidos da Europa, como um acordo entre os capitalistas europeus. Mas para quê? Para esmagarem juntos o socialismo na Europa, defenderem juntos as colônias roubadas contra Japão e EUA...
Com a base econômica atual, ou seja, com o capitalismo, os Estados Unidos de Europa significam a organização da reação para deter o desenvolvimento mais rápido da América do Norte. Os tempos em que a causa da democracia e do socialismo estava ligada somente à Europa passaram, para não mais voltar>>[11].
A análise leninista não deixa de pé nenhuma das aspirações do PEE. Como é possível falar de uma UE democrática em plena tendência à reação imperialista? Como se pode falar, com um mínimo de seriedade, de uma UE pacífica, quando a guerra imperialista é uma constante e os monopólios europeus se unem para a disputa com outras potências imperialistas? Como se permitem falar de uma Europa social quando a UE se organiza para demolir os direitos sociais e intensificar a exploração da força de trabalho?
Nem existiu nem pode existir Europa social no capitalismo, digam o que disserem as forças oportunistas do PEE. Engels dedicou às tolices do sr. Dühring as seguintes palavras: << Não basta que eu insista em classificar uma escova para botas na unidade “animais mamíferos” para que nela de repente brotem glândulas mamárias>>[12]. Do mesmo modo, não se pode converter a União Europeia em instrumento de paz, igualdade, respeito ao meio ambiente e políticas sociais.
As forças do PEE trasladaram ao âmbito europeu as posições oportunistas que décadas atrás adotaram em seus próprios países. Negaram a revolução socialista, negaram a ditadura do proletariado, renunciaram ao objetivo de construir o socialismo-comunismo, negaram o internacionalismo proletário, abraçaram o antissovietismo, praticaram e praticam o cretinismo parlamentar e o reformismo extremo. Estas posições, trasladadas ao âmbito da União Europeia, levam à aplicação de uma linha contrária aos interesses do movimento operário e do movimento comunista internacional e que se sustenta na defesa das seguintes posições:
- Defesa da União Europeia como contrapeso no cenário internacional, especialmente em relação aos EUA, mediante o deslocamento na correlação de forças a favor de um mundo supostamente “mais justo” e “mais democrático”, assentado sobre a denominada multipolaridade.
- Defesa de frentes amplas da “esquerda”, que diluem o papel dos Partidos Comunistas, negam suas funções revolucionárias e pressionam para a mutação e integração das forças comunistas.
- Participação em governos capitalistas, como sucedeu na França ou em distintas comunidades autônomas espanholas, onde a Esquerda Unida governou ou governa com o PSOE, como aconteceu também em Euskadi, Cataluña, Asturias e Andalucía, onde a EU votou favoravelmente às demissões e à redução de salários dos trabalhadores e trabalhadoras do setor público.
- Defesa do reformismo sindical, baseado no compromisso e na conciliação de classes que pratica a Confederação Europeia de Sindicatos.
- Negação de tudo o que se relaciona com a construção do socialismo-comunismo, rechaçando as tradições revolucionárias em oposição aberta ao socialismo científico, à luta de classes e à revolução socialista.
O PEE, criado sob o manto das diretrizes europeias e das instituições da UE, não é uma força ingênua. Está chamada a desempenhar, e de fato o faz na prática, o papel que cabe ao oportunismo em todo momento e lugar: a integração do movimento dos trabalhadores, sua adaptação ao capitalismo, sua conversão em um movimento de caráter burguês.
Sobre isso, é de especial interesse a análise que os oportunistas realizam sobre a atual crise capitalista. As causas da crise não estão, para as forças do PEE, na própria lógica interna da economia capitalista, mas num determinado tipo de gestão, a neoliberal, que teria levado o capitalismo a cometer certos excessos que se convertem em causas da crise. Portanto, as forças do PEE se opõem às atuais políticas de demissões impulsionadas por uma fração da oligarquia (que identificam com a direita – neoliberal) para abraçar, logo em seguida, as políticas expansivas impulsionadas pelo setor oligárquico que historicamente representou a socialdemocracia. É isso que explica seu discurso retórico sobre a necessidade de voltar a atenção ao setor produtivo ou à economia real, a que contrapõem artificialmente um setor financeiro-especulativo, e também o que explica as posições que vêm defendendo: <<as pessoas antes que os juros>> ou <<não é uma crise, é uma fraude>>, coincidindo com os movimentos de “indignados” que são funcionais ao sistema de dominação e exploração dos interesses de classe da pequena burguesia.
Seu programa de ação serve à retomada do ciclo de reprodução ampliada do capital através de políticas de investimentos tipicamente socialdemocratas. Nas palavras do atual Secretário-Geral do PCE, José Luis Centella, <<caminhar em direção a um modelo onde a economia real se imponha à especulativa>>[13]. No caso do PCE, sua chamada Alternativa Social Anticapitalista condensa a proposta política oportunista para enfrentar a crise sistêmica defendendo as seguintes posições: <<papel principal dos ICO (créditos públicos à pequena empresa) e de um banco público, reforma fiscal contrária ao aumento do IVA (Imposto sobre o Valor Agregado) que aumente a progressividade dos impostos (Imposto de Sociedades e Imposto sobre a Renda de Pessoas Físicas) enquanto se diminuem os impostos indiretos (IVA) e se retoma o Imposto sobre o Patrimônio. Do mesmo modo, devemos defender que as Caixas de Poupança adiem os despejos para as famílias em situação de desemprego>>[14]. O que têm estas propostas de diferente em relação à socialdemocracia? O que têm estas propostas de anticapitalista?
As posições do PEE e de seus partidos membros geram ilusões utópicas nas massas trabalhadoras, embelezam a união interimperialista que constitui a União Europeia e orientam as lutas operárias e populares ao caminho sem saída de sua reforma. Que baste como exemplo dizer que o PCE defendia em 1989, ante as eleições europeias, o seguinte: <<As próximas eleições deverão abrir um processo constituinte, que dote o Parlamente Europeu de um mandato para elaborar uma Constituição democrática>>. Essa foi a posição defendida pelo PCE perante a classe trabalhadora espanhola. Os monopólios aproveitaram anos mais tarde a proposta do PCE, tratando de impor uma Constituição brutal aos povos da UE, em relação à qual a Esquerda Unida se lamentou lançando a patética consigna de <<Europa sim, mas não assim>>.
O PCPE conhece em primeira pessoa o jogo duplo que o PCE pratica em suas relações internacionais. Nos últimos tempos, sua política internacional se orienta a se aproximar de Partidos Comunistas que se negaram a fazer parte do PEE. Para isso, disfarçam o papel que o próprio PCE desempenha na Espanha, espalhando por toda parte a ideia de um inexistente fortalecimento do partido baseado no exercício da autocrítica. Fundamentam seu discurso na necessidade de que o PEE se fortaleça com a presença de mais partidos comunistas, o que permitiria corrigir algumas questões em relação às quais se mostram cinicamente críticos.
O certo é que o PCE ocupa a vice-presidência do PEE. Desde essa posição, aposta sem pestanejar em forças oportunistas como o SYRIZA na Grécia ou o Bloco de Esquerda em Portugal, com os quais partilham postos de direção no PEE.
Mas o papel do PCE não se limita ao entorno europeu. Os oportunistas espanhóis, utilizando as relações históricas e a coincidência idiomática com distintos países latino-americanos, defendem para a América Latina a mesma posição que o PEE defende para a Europa, neste caso abraçando as teses do chamado socialismo do século XXI. Contam para isso com os vultosos recursos com que a UE dota o PEE, que são empregados para promover a mutação das forças comunistas nos cinco continentes.
Exemplo paradigmático deste trabalho dissimulado realizado pelo PCE e pelo PEE é a organização do Seminário Crise e Democracia na Bielorrússia, em apoio às forças pró-imperialistas Mundo Melhor, ao qual o PCE e a Esquerda Unida enviaram o senhor Pedro Marset, que foi expulso pelos autoridades bielorrussas dia 08 de junho de 2012[15].
A posição dos partidos marxistas-leninistas consequentes a respeito da natureza e do caráter de uma união imperialista como a União Europeia é clara. Se trata de uma posição de princípios baseada na análise do processo de “construção europeia” através de categorias científicas e que se opõe diametralmente às avaliações das organizações que conformam o Partido da Esquerda Europeia e, coerentemente, rechaça e combate as posições políticas e táticas a que estas conduzem, que já foram mencionadas.
Neste sentido, a declaração de 21 Partidos Comunistas e de Trabalhadores da Europa em relação às eleições europeias de 2009 é meridianamente clara: <<A União Europeia é uma opção do capital. Promove medidas a favor dos monopólios, da concentração e centralização do capital. Com o “Tratado de Lisboa”, suas características de bloco econômico, político e militar imperialista se fortaleceram contra os interesses dos trabalhadores e dos povos. Estão sendo reforçados o armamentismo, o autoritarismo e a repressão estatal>>[16].
Não variou um milímetro a posição que mantínhamos na declaração bilateral assinada por nosso partido e pelo Partido Comunista da Grécia em março de 2012, sobre o fato de que a realidade da crise capitalista está pondo em evidência as forças burguesas e oportunistas e tem servido para mostrar com clareza que <<as propostas do PEE relativas a um “desenvolvimento capitalista favorável aos povos” e ao recurso a empréstimos variados por meio do BCE, que a classe trabalhadora e os setores populares pobres terão que pagar, estão feitas sob medida para atender aos interesses do grande capital >>[17].
A crise capitalista tornou patente para grandes setores da classe operária e do povo trabalhador que a União Europeia só obedece aos interesses dos grandes monopólios, e vai mostrando para as massas que não valem posições intermediárias, mas uma posição clara de derrubada do poder dos monopólios e das estruturas políticas que servem a eles, em última de derrubada do poder burguês, que passa necessariamente pela desvinculação, unilateral, de cada um dos Estados-membro destas uniões imperialistas.
O PCPE afirma nas teses do IX Congresso, sem ambiguidades, que a posição de princípios sobre a natureza e as características da União Europeia delimita o campo entre as organizações revolucionárias e as organizações reformistas. Sobre esta base, é facilmente comprovável como as posições reformistas não só imperam no seio do PEE como também podem encontrar espaço, com coincidência surpreendente, em organizações procedentes de correntes a princípio tão aparentemente antagônicas como o maoísmo ou o trotskismo.
As dinâmicas políticas mais recentes estão servindo para constatar que as posições de esquerda e de direita no seio do movimento operário acabam confluindo com o reformismo, em nome de uma suposta flexibilidade tática que termina pondo entre parênteses e negando toda estratégia revolucionária.
Vejamos alguns exemplos. No seio do PEE, como já assinalado, convivem organizações procedentes do eurocomunismo, do trotskismo e do maoísmo. Por exemplo, no Bloco de Esquerda português conviviam (até a dissolução das organizações que o formaram originalmente) a maoísta União Democrática Popular e o trotskista Partido Socialista Revolucionário. Na SYRIZA grega encontramos a maoísta Organização Comunista da Grécia – KOE – junto com, entre outras, a trotskista Esquerda Operária Internacionalista – DEA. Na Aliança Rubro-Verde dinamarquesa estão o Partido Socialista Operário – SAP – trotskista, e o Partido Comunista Operário – KAP – maoísta. Em todos estes casos, independentemente das propostas ou análises com que adornem seus documentos ou páginas na internet, os partidos apoiam as propostas do PEE, o que inviabiliza qualquer outro enfoque que poderiam querer dar a suas posições – em nome da tática ou do que quer que seja.
Mas esta confluência não acontece apenas no interior do PEE. Não deixa de chamar a atenção que outras organizações, procedentes também deste tipo de correntes ideológicas, coincidam com o PEE quanto a sua percepção da UE. Tomemos como exemplo o Partido Socialista (SP) holandês e o partido espanhol Esquerda Anticapitalista, irmanado com o NPA francês.
Dennis de Jong, eurodeputado pelo SP, escrevia recentemente um artigo intitulado “A cara social da Europa”, publicado na página web de seu partido, no qual declarava abertamente o seguinte: <<Seguramente ajudaria se o povo trabalhador soubesse que Bruxelas busca reforçar seus direitos, mais do que retirá-los. Um projeto social deste tipo melhoraria a posição de Bruxelas e teria o apoio do SP>>[18]. Em outro texto, intitulado “Uma Europa melhor começa agora” [19], o SP declara suas propostas para atingir o objetivo mencionado, entre elas: o fortalecimento dos parlamentos nacionais, o fortalecimento dos governos nacionais, introduzir a iniciativa legislativa popular ou tornar mais transparente o Conselho. Em definitivo, medidas que poderiam ser subscritas por todos e cada um dos membros de fora do PEE.
A Esquerda Anticapitalista, por sua vez, afirmava abertamente em seu programa para as eleições europeias de 2009[20] que <<a construção da União Europeia durante as últimas décadas esteve mais centrada no estabelecimento de um bloco comercial e econômico que em garantir a “europeização” e a generalização dos direitos sociais>>, deixando entrever a possibilidade de que caberia uma construção “comprometida com os direitos sociais” sem pôr em questão o marco capitalista. Talvez o resumo seja a seguinte proposta em suas “10 medidas urgentes e alternativas contra a Crise e a Europa capitalista”:
<<Outra Europa é possível: revogação do Tratado de Maastricht e do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Não ao Tratado de Lisboa, por uma Europa baseada no nivelamento por cima dos direitos e conquistas, e na solidariedade com os povos do sul>>.
Todas propostas de reformas, que podem soar bem aos ouvidos do povo trabalhador por se oporem a expressões concretas do caráter capitalista da UE, mas sem fazer referência alguma a como acabar com a UE.
Definitivamente, constatamos a confluência de certas organizações procedentes do trotskismo e do maoísmo com o oportunismo do PEE na hora de enfocar as prioridades de luta da classe trabalhadora e dos povos da Europa contra a UE, visto que, independentemente das análises sobre as quais se sustentem, a posição prática final sempre acaba supondo não se enfrentar contra a UE dos monopólios de maneira direta.
E tudo isso não ocorre em qualquer momento, mas numa situação de crise estrutural do sistema capitalista internacional que caracteriza a época como de transição do capitalismo ao socialismo.
[1] LENIN. La revolución proletaria y el renegado Kautsky. O.C. Editorial Progreso, tomo 37, página 304.
[2] REVISTA COMUNISTA INTERNACIONAL Nº 2, dezembro de 2009, edição espanhola, páginas 25 a 39.
[3] EL SOCIALISMO. UNA BUSQUEDA PERMANENTE (Materiais do PCE entre o XII e o XIII Congresso). Páginas 114 e115.
[4] Santiago Carrillo esteve à frente da Secretaria Geral do PCE desde o VI Congresso – reunido em Praga de dezembro de 1959 a janeiro de 1960 – até o ano de 1982.
[5] Noveno Congreso del PCE. Informes, debates, actas y documentos. Ediciones PCE. Impresso em Bucareste (Romênia) em 1978. Página 41.
[6] Idem, páginas 410 y 411. Os sublinhados são nossos.
[8] EL SOCIALISMO. UNA BUSQUEDA PERMANENTE (Materiais do PCE entre o XII e o XIII Congresso). Página 32.
[9] Nos documentos da V Conferência do PCE se afirma: “Para impulsionar este processo de articulação, o PCE considera necessária a incorporação à CES da Confederação Sindical das COs, assim como da CGT francesa e da Intersindical Portuguesa, se comprometendo a realizar as ações necessárias em apoio a esta incorporação”.
[10] IZQUIERDA EUROPEA. Publicação em castelhano distribuída pelo Partido da Esquerda Europeia, com o patrocínio do Parlamento Europeu, no ano de 2004. Página 5.
[11] V.I.LENIN. Obras Completas. Tomo 26. Editorial Progreso. Páginas 374 a 378.
[12] F. ENGELS. Anti – Dühring. La subversión de la ciencia por el señor Eugenio Dühring.
[13] Declarações de José Luis Centella em um almoço com os meios de comunicação em Madrid, dia 28 de junho de 2012: www.pce.es/secretarias/seccomunicacion/pl.php?id=5080
[14] O documento do PCE intitulado POR LA UNIDAD DE LA IQUIERDA EN TORNO A UNA ALTERNATIVA SOCIAL ANTICAPITALISTA (ASA) A LA CRISIS, pode ser consultado em www.pce.es/docpce/pl.php?id=3725.
[15] http://www.larepublica.es/2012/06/bielorrusia-impide-la-entrada-a-pedro-marset-pce-que-iba-a-un-acto-del-opositor-mundo-mejor/.
[16] http://inter.kke.gr/News/2009news/2009-05-join-euelections
[17] Declaración conjunta del Partido Comunista de Grecia (KKE) y el Partido Comunista de los Pueblos de España (PCPE). 16 de marzo de 2012. http://www.solidnet.org/greece-communist-party-of-greece-/2728-cp-of-greece-joint-statement-kke-pcpe-en-sp
[18] http://international.sp.nl/bericht/97960/120923-weeklog_dennis_de_jong_the_social_face_of_europe.html
[19] http://international.sp.nl/goals/better_europe/more_democratic.shtml
[20] http://www.anticapitalistas.org/wiki/index.php?title=Programa